terça-feira, 19 de junho de 2012

A Cura pela Fé


Hoje em dia, Jeff Levin é considerado um dos principais nomes nos estudos científicos a respeito da relação entre as práticas religiosas ou espirituais e a saúde.

Gilberto Schroeder

Várias pesquisas vêm sendo realizadas nos últimos anos envolvendo o que alguns chamam de “o poder da oração”.
Uma das grandes autoridades mundiais nesse campo é o dr. Jeff Levin, um epidemiologista social formado em religião, sociologia, saúde pública, medicina preventiva e gerontologia na Universidade Duke, na Universidade da Carolina do Norte, na Divisão Médica da Universidade do Texas e na Universidade de Michigan.

Ele é pesquisador do National Institute for Healthcare Research e seus estudos podem ser definidos como epidemiologia da religião – o estudo científico de como fatores espirituais previnem a incidência de enfermidades em determinadas regiões e a mortalidade, e promovem a saúde e o bem-estar - estabelecendo o relacionamento existente entre ciência, medicina e espiritualidade.

Seu trabalho estabelece pontes entre diferentes campos de atividade, como epidemiologia, gerontologia, sociologia, psicologia e medicina alternativa e complementar.

As perguntas básicas que seus estudos apresentam são:
Como a fé religiosa atua como um recurso na prevenção de doenças e na promoção do bem-estar?;
Um relacionamento de amor com Deus é uma característica das pessoas saudáveis?;
A religiosidade é um fator de proteção contra doenças ao longo do processo de envelhecimento?;
Existem efeitos terapêuticos ou preventivos de energias sutis ou estados alterados de consciência?

O resultado de suas pesquisas foi publicado no livro Deus, Fé e Saúde (Editora Cultrix).
Entrevistamos o dr. Levin por e-mail para que ele nos falasse mais sobre seu trabalho e as mais recentes descobertas nessa área, assim como sua relação com teorias e posturas mais conservadoras da medicina, que ainda resistem em aceitar as evidências científicas coletadas nos últimos vinte anos.


A relação entre a oração ou as preces e a saúde se tornou um dos assuntos mais comentados da atualidade.
Essa relação positiva entre ambas está definitivamente comprovada ou ainda estamos no campo das evidências?
Em que ponto se encontram as pesquisas científicas?

O campo da pesquisa em espiritualidade e saúde compreende, na verdade, três áreas de estudo diferentes.
Uma delas, aquela em que minha pesquisa se focou nos últimos vinte anos, envolve investigações epidemiológicas de como a fé ou o envolvimento religioso influencia a saúde física e mental.
Já foram feitos mais de mil estudos com esse enfoque e, hoje, a idéia de que aspectos da vida religiosa podem ser benéficos para a saúde ou o bem-estar de algumas pessoas é aceita de forma geral e não controversa.
As duas outras áreas de pesquisa em espiritualidade e saúde envolvem:
1) estudos experimentais de laboratório, como em psicofisiologia, explorando os correspondentes espirituais de estados alterados de consciência;
2) testes clínicos investigando os efeitos da oração à distância.
Em contraste com a pesquisa epidemiológica, esses estudos encontram muito mais resistência.
Pessoalmente, acredito que existem boas evidências para ambas, mas os temas e conceitos levantados por esses estudos desafiam a estreiteza da visão de mundo de muitos cientistas das correntes estabelecidas.


Tem-se falado na influência de fatores espirituais ou religiosos no processo de cura.
Foi realizada alguma tentativa no sentido de determinar se se trata, de fato, de fatores espirituais, ou pode se tratar da ação da mente, como ocorre em tantos dos chamados “fenômenos parapsicológicos”?
Em outras palavras, a crença de uma ou mais pessoas daria início a um processo ou uma ação mental.
O que o senhor pensa a esse respeito?

Eu não estou certo de que usando os métodos naturalistas da ciência empírica poderemos algum dia desemaranhar esses dois conceitos.
Aqui, nos Estados Unidos, médicos religiosamente muito conservadores opuseram muita resistência a essa pesquisa.
Eles vêem os resultados de estudos de oração e cura, e quer atribuir qualquer cura subseqüente à intervenção “sobrenatural” de Deus.
Outros reconhecem a possibilidade de que o ato de rezar envolva criar uma intenção mental positiva que pode ter, por si mesma, um efeito curativo.
Mas isso é interpretado pelo primeiro grupo como blasfemo e até mesmo, acredite ou não, satânico – porque parece implicar efeitos que são inerentemente parapsicológicos, e a parapsicologia é considerada maligna.
Considero essa reação perturbadora por duas razões.
Em primeiro lugar, fez muitos médicos cristãos conservadores rejeitar efetivamente os resultados de estudos de oração e cura, porque os estudos implicavam que as orações de qualquer um podem ser efetivas, independentemente de religião, talvez devido a algum tipo de mecanismo paranormal.
Isso ameaça as reivindicações de exclusividade que alguns fazem para sua própria religião e para os resultados de orações dessa religião.
Em segundo lugar, se os resultados forem devidos “apenas” à parapsicologia – em vez de a Deus, por assim dizer -, por que isso seria um problema?
Em última instância, todos esses efeitos vêm de Deus.
Eu acredito que o Criador dotou os seres humanos com todo tipo de aptidão, algo que os grandes místicos conhecem há milhares de anos e que cientistas ocidentais só agora procuram entender.
Mais de cem anos de pesquisa parapsicológica confirmaram isso, para satisfação minha e de muitos outros.


Durante suas pesquisas, o senhor teve conhecimento da ação dos chamados “médiuns de cura”? De alguma forma, esses casos podem estar relacionados?
Já ouvimos falar que a cura não provém exatamente dos médiuns, mas da crença das pessoas que os consultam.

Pessoalmente, nunca pesquisei sobre médiuns, mas tenho uma posição a respeito.
Acredito que, quando se trata de orações, cura pelas mãos ou por energia, ou qualquer outra forma sutil de terapia bioenergética ou relativa à consciência, todos os elementos da interação curativa podem ser importantes; em outras palavras, as habilidades, características e intenções de quem cura, o método da cura e as crenças do paciente.
Tudo isso pode entrar em jogo até certo ponto, mas pode variar de acordo com a situação.
Quanto a uma condição sine qua non para o sucesso da cura, já ouvi muitos curandeiros dizendo que descobriram, por experiência própria, que é indispensável haver uma intenção amorosa por parte do curandeiro ou rezador; independentemente de outros elementos (método, técnica, expectativas de paciente, etc.).
É fundamental haver uma intenção sincera e abnegada de amor fraterno, que deseje o melhor benefício para a pessoa, de acordo com a vontade de Deus.


Já ouvimos falar de experiências de “prece a distância”, com resultados positivos. Inclusive, as pessoas que realizavam as preces não sabiam a quem elas se dirigiam.
O que o senhor pode nos dizer sobre esse assunto?

Como muitos leitores já devem saber, houve vários estudos recentes que investigaram os efeitos da oração a distância.
Alguns desses estudos foram, de fato, bem controlados, com método duplo-cego e amostragem criteriosa; foram testes clínicos de certa forma similares aos testes farmacológicos que avaliam os efeitos de novas drogas.
Para horror de muitos médicos acadêmicos convencionais, alguns desses estudos mostraram resultados, com índices de recuperação que foram melhores entre os pacientes que foram alvo de orações sem o saberem do que entre os pacientes dos grupos de controle.
Acredite ou não, já houve quase duzentas investigações desse tipo. E não só em pessoas, mas outros organismos, como animais e plantas.
A pesquisa foi compilada de forma muito abrangente em um livro soberbo chamado Spiritual Healing (Cura Espiritual), escrito por meu amigo Dr. Dan Benor, um médico norte-americano.
Ele descobriu que cerca de um quarto dos estudos foi realizado com uma metodologia de pesquisa impecável, e que, desse um quarto, aproximadamente três quartos constataram resultados positivos.
Em outras palavras, isso é evidência e que orações a distância tiveram um efeito mensurável e benéfico.


Em seu livro Deus, Fé e Saúde, o senhor estabelece uma relação entre o modo como o compromisso religioso influencia o comportamento, e o modo como o comportamento influencia a saúde.
No entanto, o comportamento de uma pessoa não está necessariamente ligado ou necessariamente dependente de um compromisso religioso.
Foi feita alguma pesquisa no sentido de determinar o comportamento de pessoas não-religiosas, para ver se aquelas que têm comportamento saudável têm uma saúde melhor, como as religiosas ou espiritualizadas?
O senhor diz em seu livro que as pesquisas mostram que o comportamento não-saudável não relacionado à postura religiosa ou espiritual?

É claro que as pessoas podem ser perfeitamente saudáveis sendo ou não sendo religiosas ou espiritualizadas.
O que tentei fazer no meu livro foi examinar os “mecanismos” subjacentes às relações entre espiritualidade e saúde observadas em pesquisas.
Essas associações existem, eu concluí, exatamente porque a religiosidade pode motivar comportamentos saudáveis, pode gerar relações sociais de apoio e solidariedade, pode produzir sentimentos ou emoções poderosos, etc.
E já se sabe que cada um desses fatores – hábitos saudáveis, relacionamentos, sentimentos – é importante para a saúde.


Existem diferenças visíveis entre “estar associado a uma religião” e ter o que se poderia chamar de uma “atitude espiritual independente”?
Faz diferença se a pessoa reza numa igreja ou em qualquer outro tipo de templo, ou se ela reza em casa, e segundo suas próprias regras?
O que conta, afinal, é o comportamento, é o modo de pensar, é uma sintonia especial, ou outro fator?

Eu não acredito que faça qualquer diferença.
Um dos primeiros fatos básicos que descobri quando comecei minha pesquisa, vinte anos atrás, é que um efeito saudável da religiosidade ou da espiritualidade parecia ser uma constante universal na natureza.
Isto é, quando se toma como referência ou pessoas sem um caminho espiritual ou a população como um todo, efeitos epidemiologicamente protetores ou preventivos foram observados em católicos, protestantes, judeus, budistas, hindus, muçulmanos, zoroastristas, etc.
Além disso, uma quantidade considerável de estudos mostrou um benefício às pessoas que, mesmo não sendo formalmente religiosas, estão envolvidas com meditação ou outras buscas espirituais.
O Institute of Noetic Sciences, uma esplêndida organização na Califórnia, publicou um relatório excelente chamado The Physcal and Psychological Effects of Meditation (Os Efeitos Físicos e Psicológicos da Meditação) documentando esses estudos.


O senhor entende que essa aproximação da ciência com a religião é uma tendência para o futuro?
O filósofo Ken Wilber já vem se manifestando há anos a respeito da necessidade de se desenvolver aproximando as visões científica e espiritual.
O que o senhor pensa a esse respeito?

Nos últimos trinta anos, os acadêmicos dos Estados Unidos têm demonstrado um considerável interesse em explorar a interface entre religião e ciência.
Porém, muito desses discursos aconteceu dentro do contexto rígido das filosofias e visões de mundo adotadas pelos acadêmicos e pelas religiões predominantes.
Um “novo paradigma” que unifique as abordagens científica e espiritual seria certamente um desdobramento bem-vindo.
Mas precisamos nos perguntar: Qual paradigma?
Qual abordagem científica?
Perspectiva espiritual de quem?
Ken Wilber fala para muitas pessoas que têm interesse intelectual na consciência e em caminhos espirituais alternativos, mas eu não diria que o mundo acadêmico ortodoxo esteja pronto para isso. Para boa parte da comunidade acadêmica, o diálogo entre ciência e religião é um diálogo entre uma visão muito materialista e mecanicista de ciência e uma versão cartesiana de espiritualidade, baseada num paradigma muito antigo.


Já existe alguma tentativa de se desenvolver uma teoria a respeito dessa ação da prece na melhora da saúde das pessoas, ou ainda é muito cedo para isso?
O senhor entende que uma tória desse gênero deverá estar ligada a teorias desenvolvidas pela parapsicologia, envolvendo a atuação da mente sobre a matéria?

Uma das críticas que os céticos organizados fazem incessantemente à literatura científica sobre oração e cura é que esses estudos não podem ser verdadeiros porque não existe uma teoria que explique as descobertas.
Assim, de acordo com essa crítica, os resultados são impossíveis.
A crítica é errônea por dois motivos distintos.
Primeiro, a pesquisa clínica estabelece uma distinção entre eficácia e mecanismo de ação.
A eficácia de uma terapia pode ser demonstrada muito tempo antes de se compreender o mecanismo subjacente de ação.
É o caso da aspirina, que sabíamos que funcionava antes de entendermos por quê.
Ignorar ou condenar os resultados de pesquisas metodologicamente sólidas porque eles não se enquadram nas atuais teorias seria a morte da ciência.
Qualquer grande novo avanço, por definição, será gerado pela necessidade de se formular uma nova perspectiva teórica que responda a dados inesperados.
É assim que as coisas têm funcionado ao longo da história da ciência.

Mas a segunda razão que invalida as objeções dos céticos é muito mais básica: existem, de fato, teorias e perspectivas para nos ajudar a entender como e por quê a oração pode curar.
Sobre esse tópico já foi escrito mais do que eu poderia abordar aqui, mas basta dizer que há muitos anos têm surgido livros acadêmicos e artigos científicos com esse enfoque.
Propuseram-se muitos mecanismos de ação possíveis, aproveitando trabalhos estimulantes nas áreas da física, do estudo da consciência, da psicofisiologia e da parapsicologia.
Todo tipo de força, energia ou campos foi cogitado, inclusive conceitos como os de mente estendida, campos mórficos, mente não-local, psi, energias sutis, etc.
O pesquisador alemão, Dr. David Aldridge, escreveu muito sobre esse tópico, assim como meu amigo Dr. Larry Dossey, o médico norte-americano, em muitos de seus livros, como Palavras que Curam (Healing Words, Editora Cultrix).

Acredito que a parapsicologia guarda uma riqueza de demonstrações empíricas e de proposições teóricas no que tange à oração a distância e seus efeitos de cura.
Mas, infelizmente, muitos cientistas e médicos acadêmicos ortodoxos desdenham e não acreditam nesse trabalho, ao mesmo tempo em que o conhecem tão pouco.
Essa postura vem principalmente da ignorância e de uma necessidade corporativista de proteger o próprio território.
É pena, mas isso também parece ser uma constante na história da ciência e da medicina.


Para Saber Mais
Deus, Fé e Saúde - Jeff Levin - Editora Cultrix
Fone : (11) 6166-9000
Site de Jeff Levin: / www.religionandhealth.com/index.htm

Nota de Wagner Borges

Texto extraído da revista Sexto Sentido 52, páginas 26-31

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