Muito da história da humanidade (e do vinho) foi descoberta
após arqueólogos encontrarem a tumba intacta de
Tutancâmon
por Arnaldo Grizzo
Um desses detalhes foi a vitivinicultura dos primórdios da humanidade.
Em 4 de novembro de 1922, o arqueólogo britânico Howard Carter encontrou o túmulo desse jovem faraó, que assumiu o trono com 12 anos e reinou por apenas nove, morrendo precocemente – acredita-se, depois de muita pesquisa, que por malária.
Essa descoberta foi considerada uma das mais importantes, já que a tumba estava intacta – lembremos que ladrões saquearam os principais sítios arqueológicos egípcios durante séculos a fio para pegar os tesouros dos grandes reis, restando pouquíssimos lugares intocados.
Então, mesmo Tutancâmon sendo um rei “modesto”, o que foi encontrado em seu túmulo deu margem para pesquisas que responderam diversas perguntas sobre essa época da humanidade.
Algumas das primeiras coisas encontradas na tumba foram vasos e ânforas, que deram testemunho de como a viticultura já era organizada no Egito.
Hieróglifos revelam que terras denominadas “pomares de vinhas” eram cultivadas em Fayum (130 km ao sudeste do Cairo) e também no delta do Nilo.
Interessante notar que o faraó possuía seu próprio vinhedo, cuja produção era usada nos ritos dos funerais, já que o vinho, além de estar à mesa, também estava no culto aos deuses, e servia apenas ao soberano e seus convivas.
Um dos “single vineyards” egípcios chamava-se “Seja louvado Hórus que está no limiar dos céus”
Como na Borgonha
Se você acha que o fato de cada vinhedo possuir um nome é um coisa dos franceses da Borgonha – que herdaram isso dos romanos –, está enganado.
Essa prática vem de muito tempo antes.
Assim como os vinhedos borgonheses hoje, os melhores terroirs egípcios recebiam um nome específico.
A vinha do faraó Djoser, da III Dinastia do Antigo Império, chamava-se “Seja louvado Hórus que está no limiar dos céus”. Então, tudo sempre era voltado à adoração do deus Osíris (pai de Hórus), que estava ligado à ressurreição e ao julgamento dos mortos.
O vinho feito nesse vinhedo recebia o nome de “bebida de Hórus”, que ficava à disposição para a degustação dos faraós mortos, em diversas ânforas, enquanto eles esperavam a nova vida.
Estudos também mapearam alguns vinhos egípcios que ficaram famosos como o taniótico, um branco doce untuoso, o Kan-Komet, que era feito para Ramsés III (entre 1198 e 1166 a.C.), e o mareótico, um branco doce e suave apreciado por Cleópatra.
Vinhos safrados
Mais incrível ainda é ver que as 26 ânforas encontradas com Tutancâmon tinham a indicação do ano da safra, assim como das parcelas dos vinhedos de onde vieram as uvas, do proprietário dos vinhedos e do enólogo.
Em dois jarros havia a inscrição: “Quarto ano.
Vinho de muito boa qualidade da propriedade de Aton nas margens do rio Ocidental.
Enólogo: Ramose”.
Depois dessas descobertas, um mistério ainda ficou no ar.
Qual a cor do vinho do faraó?
Somente em 2004, com novas pesquisas é que se pôde analisar melhor os resquícios e deduziu-se que havia três tipos de vinho: tinto, branco e fortificado.
A presença de vinho branco surpreendeu os pesquisadores, que criam que esse tipo só viria surgir muito tempo (cerca de 1.500 anos) depois.
A verdade é que a tumba de Tutancâmon não para de ser analisada e quanto mais as pesquisas científicas se desenvolvem, mais mistérios ela revela.
O que mais os egípcios ainda vão nos ensinar?
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