Glúten.
Este é o novo
vilão que deve ser banido do cardápio em nome da saúde e da boa forma.
Há tempos
que médicos e nutricionistas sabem que o glúten, uma substância encontrada no
trigo, no centeio, na cevada e na aveia - A
GLIACINA -transforma-se numa espécie de cola ao chegar no intestino e gruda nas
paredes intestinais, provocando, aos poucos, saturação do aparelho digestivo, o
aumento da gordura visceral (na região do abdômen), dores articulares, alergias
cutâneas, enxaqueca e depressão.
O perigo se agravou devido ao consumo
excessivo de pães, biscoitos, macarrão, bolos.
Até alguns queijos e embutidos
contêm o agora maldito glúten.
Os resultados já aparecem nos consultórios de
nutrólogos, alergistas e nutricionistas: obesidade, síndrome de resistênc ia à insulina,
deficiência de cálcio (o trigo vem sempre adicionado de açúcar), alergias,
diarréias, doenças auto-imunes.
O nutrólogo João Curvo
diz que, para os chineses, o excesso de glúten
no organismo é sinal de má higiene interna: o metabolismo emperra, favorecendo
bactérias que gostam de calor e estagnação.
A pediatra e nutróloga
Clara Brandão, do Ministério da Saúde, premiada por suas alternativas para a
mesa brasileira, defende o que chama de nossa "soberania alimentar": mandioca, milho e arroz no lugar do trigo
importado, que faz tanto mal.
E, se abolir o glúten ajuda a emagrecer, a
"dieta sem glúten" virou febre nas academias.
Agora, pães de aipim e de milho,
macarrão de arroz e cookies de soja são as novas "delícias" dos supermercados.
GRAÇAS AO SÚBITO
DESEJO DA FILHA LOUISE DE EMAGRECER, a família de César Hasky, dono do
restaurante japonês Ten Kai, em Ipanema, descobriu as maravilhas da vida sem
glúten.
A mãe, Rina, ao levar a filha ao nutricionista Leonardo Haus também
adotou a reeducação alimentar que consiste em evitar saturação do metabolismo
provocada pelo excesso de glúten no intestino.
A surpresa veio quando mãe e
filha começaram facilmente a emagrecer e até César, que não estava de dieta,
adotou os pães de aipim, de abóbora e de cenoura, encomendados na rede Mundo
Verde ou no restaurante Celeiro:
- A barriga vai
sumindo, você fica mais leve.
Eu não imaginava que o glúten fizesse tanto mal.
E
você vive muito bem sem o trigo.
Pode comer pães e bolos gostosos sem glúten de
manhã ou à tarde, sem sofrimento algum - diz Rina.
O
nutricionista Leonardo Haus recomenda um período de três meses de
dessensibilização ao glúten, no qual não se pode comer trigo, centeio, cevada ou
aveia, os quatro cereais que contêm a substância.
Depois, segundo ele, é
possível comer esporadicamente sem risco de danos:
- Essa é a idéia da
reeducação alimentar.
Você pode comer um pãozinho, mas o excesso pode alterar
todo o seu metabolismo, baixar a imunidade do organismo e levar a doenças.
Mas é
bom lembrar que nem todo obeso tem essa intolerância alimentar.
Intestino sem glúten produz serotonina e gera
alegria.
A guerra contra o pão e o macarrão já começou também na
escolinha de vôlei das jogadoras Sandra e Elaine, no Leblon.
Atletas do ranking
brasileiro de vôlei de praia, elas proíbem as alunas que querem emagrecer de
comer pão depois das 17h.
As atletas aprenderam com seus médicos que, no
entardecer, o metabolismo vai ficando naturalmente mais lento e a digestão
daquele trigo ficará ainda mais difícil.
O pãozinho terá muito mais chances de
virar gordura - e abdominal!
- Não proibimos o pão,
mas, se puderem evitar, principalmente à noite, é melhor.
Isso não significa que
não podemos comer um macarrão depois de um treino.
Pode, mas não toda hora.
O
excesso não é metabolizado e vira gordura - explica Sandra.
- Eu, às vezes, não
resisto.
Vou à padaria Rio - Lisboa e como três pães franceses quentinhos de uma
vez.
E com muita manteiga!
Mas só de vez em quando e escondido de meu técnico.
No dia a dia, evito o pão e me sinto mais leve e bem disposta.
O ideal é comer
sempre frutas e saladas - diz Elaine.
Se banir o pão foi
secando a barriga das mulheres, a nova onda chegou instantaneamente às academias
de ginástica.
A academia Velox, por exemplo, oferece saladas que há muito tempo
fazem parte dos lanches dos atletas.
Leves, nutritivas e de
baixa caloria.
As redes Body Tech e Pró-Forma também seguem o exemplo.
É um
incontrolável efeito dominó.
Se uma mulher seca abolindo o glúten, centenas de
outras vão fazer o mesmo para secar também.
E não faltam receitas
sem glúten.
Um dos segredos da
nova dieta é não desanimar diante de um pão de aipim com a consistência de uma
pedra portuguesa.
Há bons fabricantes de produtos sem glúten e outros nem tanto.
Leonardo Haus indica os pães sem glúten produzidos em Santa Catarina, vendidos
na rede Mundo Verde e no restaurante Fontes, em Ipanema, ou ainda os de
fabricação própria do restaurante Celeiro, no Leblon.
Os novos alimentos sem
glúten já estão nas prateleiras dos supermercados: macarrão de arroz, cookies d
e soja, bolos de cenoura.
Para a clínica Eliana
Correa, com pós-graduação em medicina ortomolecular, depois do período de
dessensibilização, pode-se até comer glúten de vez em quando, mas, segundo ela,
a pessoa se sente tão bem que passar a evitar o alimento, como ela própria e
suas três filhas:
- Quem sofreu a vida
inteira com enxaqueca por causa de intolerância ao glúten não vai querer mais
comer o alimento porque sabe que voltará a se sentir mal.
Aí vem a pergunta
clássica:
Mas eu vou comer o quê?
Eu, por exemplo, como batata-doce no café da
manhã.
Pode-se comer aipim, tapioca, pães sem glúten.
A variedade é imensa e os
benefícios, ainda maiores.
Eu, que brigava tanto com o leite e seus efeitos
alérgicos, descobri que o glúten é muito pior.
Eliana faz em seus pacientes
exames de sangue que detectam alergias que não causam efeito imediato, mas vão
minando o metabolismo e são chamadas por isso de alergias retardadas.
O sangue
colhido dos pacientes é enviado para laboratórios nos Estados Unidos, que dosam
intolerância a 96 alimentos.
O exame custa R$ 900. No Brasil, só há exames para
37 alimentos que causam apenas alergias imediatas (quando o paciente passa mal
imediatamente).
Um
alimento normal leva 18 horas da mastigação até ser eliminado pelo
reto.
O
glúten leva 26 horas.
O excesso vai retendo cada vez mais toxinas no organismo e
promovendo a disbiose, que é a alteração da flora normal, com fermentação,
retenção de líquidos.
É o começo de uma série de doenças articulares,
auto-imunes e até depressão.
GOSTOSO E
IRRESISTÍVEL, O PÃO FRANCÊS QUENTINHO com a manteiga derretendo pode ser maldito
para quem não quer engordar.
Mas proibido mesmo, só
para portadores da doença celíaca, uma intolerância de origem genética ao glúten
que provoca distúrbios gastrintestinais, diarréias violentas e até morte.
No
Brasil, em estimativas imprecisas, a doença atinge um em cada 300 brasileiros.
Uma delas é Ane Benati, de 39 anos, que, entre os sete irmãos, tem outros três e
uma sobrinha celíacos.
Ela viu suas irmãs
gêmeas definharem por 20 anos em busca de um diagnóstico e, há dez anos, uma
delas, Raquel Benati, quase morreu com 39 quilos para o seu 1,70m, quando enfim
descobriu que era celíaca.
- Foi só tirar o
glúten e minha irmã parecia que tinha tomado fermento.
Engordou e ficou boa
rapidamente.
Pensei que ela ia morrer.
Fiz logo o exame e vi que eu também era
celíaca, embora não tivesse ainda sintomas graves.
Porque antes de acabar com o
intestino, a doença pode provocar baixa metabólica, diabetes, hipertireoidismo e
até epilepsia - diz ela, que, por conta da doença, sugere pratos deliciosos sem
glúten para o cardápio do restaurante Cais do Oriente, do namorado Markos
Resende, no Centro.
- Ultimamente como lá
uma lasanha de vegetais feita com folhas e palmitos naturais no lugar da massa e
atum grelhado - diz Ane.
Hoje "curada" ao banir o glúten da dieta, Raquel é
presidente da seção Rio da Associação dos Celíacos do Brasil e diz que o
diagnóstico ainda é um problema:
- A medicina ainda
desconhece essa doença.
Estima-se hoje que no Rio haja 35 mil celíacos, mas só
mil com diagnóstico.
Os outros 25 mil estão passando mal pelos hospitais, nas
filas das gastrites, das diarréias crônicas, das enxaquecas, das dores
articulares sem cura.
Eu penei 20 anos até descobrir a doença, mas o médico da
Associação de Celíacos, o gastropediatra José César Junqueira, alerta que uma
simples gastrite já é indicação para os exames que detectam a
doença.
Excesso de glúten gera
intolerância também em pessoas normais,
Os exames de sangue de detectam a doença
celíaca são os de antitransglutaminase e antiendomísio, mas, segundo Raquel,
ainda não estão incluídos no Sistema único de Saúde (SUS), tampouco são aceitos
por alguns planos de saúde.
Na Europa, onde a doença celíaca tem uma incidência
maior devido ao alto consumo de trigo, há uma infinidade de alimentos sem
glúten, mas no Brasil os produtos sem glúten só agora começam a aparecer.
- O mercado está
crescendo porque as pessoas normais também estão com intolerância devido ao
excesso do consumo de trigo.
Se
o glúten é proibido para os celíacos, os normais não precisam ser tão ortodoxos.
É possível comer um pãozinho, duas ou três vezes por mês e não sentir mal-estar
algum, segundo o nutrólogo João Curvo:
-
Os leigos que se observam percebem a relação entre o excesso de trigo e o
aumento do volume abdominal, excesso de gases, dores articulares, dores de
cabeça e peso nos pés.
Quando ocorre a saturação de glúten no intestino, a
absorção dos nutrientes piora e a pessoa começa a apresentar queixas.
Essa
intolerância vai minando o sistema imunológico e vão surgindo as alergias
cutâneas, a psoríase e as artrites.
Tudo depende da quantidade do consumo.
Teresa Sá, por
exemplo, mulher do estilista Tufi Duek, da Fórum, não é celíaca, mas teve um
problema vascular, que, depois de muitos exames, descobriu que era intolerância
ao trigo:
- Eu como massa, mas tenho consciência que depois tenho que fazer um
processo de desintoxicação, sem comer glúten durante quatro ou cinco
dias.
Para a pediatra e
nutróloga Clara Brandão, do Ministério da Saúde, a mudança dos hábitos
alimentares dos brasileiros nos últimos anos, com a troca de alimentos saudáveis
e orgânicos nacionais como a mandioca, o milho e o inhame pela farinha de trigo
refinada importada, porém, já começa a causar doenças também em pessoas não
celíacas.
Ela lembra que 80% dos brasileiros vivem nas periferias urbanas
comendo pão com margarina e macarrão.
Os de maior poder aquisitivo adicionam o
queijo, o salame e o presunto, que, segundo ela, contêm aditivos químicos que
comprometem a saúde:
- Nós temos que
reforçar nossa soberania alimentar.
Nós comíamos o fubá, a tapioca, o milho,
muito mais nutritivos que o trigo, importado e nocivo.
Temos estoques
reguladores de arroz lotados, mas a merenda escolar leva trigo todos os dias.
Está havendo uma saturação do metabolismo da população em geral devido a uma
alimentação equivocada.
Esta tendência à intolerância alimentar e às doenças
subseqüentes, segundo Clara Brandão, começam no primeiro ano de vida, quando a
criança começa a comer pão, biscoito e macarrão:
- Uma criança de 7 ou
8 anos já sabe fazer sozinha o miojo, que já vem com um veneno no saquinho para
o molho.
Aquilo tem glutamato de soja, que altera a química cerebral e é uma
substância tóxica.
Fora isso, hoje ninguém mais janta, come um sanduíche.
Se
temos um alimento orgânico, como a mandioca, muito mais nutritivo e mais barato
que o trigo, e que fixa o produtor na terra, o que estamos esperando para mudar
essa situação?
O profissional de marketing Fábio Quinei, de 26 anos, já
começou há um mês a banir o glúten, cortando o pão e o macarrão para ganhar mais
disposição e malhar mais.
Ele e Larissa Munck, ambos alunos da academia Velox,
no Humaitá, trocaram o pão pela salada e pelas frutas:
- O glúten prejudica a
absorção dos nutrientes e, em um mês de dieta, dá para notar uma boa secada.
Há
também um corte no açúcar porque os doces contêm glúten.
Isso é o pior, porque
adoro doces.
Mas troquei doces por frutas! _.___
Por Márcia Cezimbra
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