terça-feira, 9 de outubro de 2012

Letra por letra

Vaticano divulga original da profecia de Fátima, mantida secreta por meio século

Cristiano Dias   
AP
Irmã Lúcia e o papa: convite à oração

A profecia que a Santa Sé guardou a sete chaves durante meio século finalmente veio à luz, na íntegra, na semana passada.
O texto original de trinta linhas do terceiro segredo de Fátima foi distribuído em seis línguas, acompanhado de uma cópia xerox do original escrito pela irmã carmelita Lúcia dos Santos, em 1944 (veja a íntegra).
 
"Quem estava à espera de impressionantes revelações apocalípticas sobre o fim do mundo ou sobre o futuro desenrolar da História deve ficar desiludido", disse o cardeal Joseph Ratzinger, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, que revelou o texto numa transmissão ao vivo pela televisão italiana.
Em maio, o Vaticano deu a própria interpretação: tratava-se apenas da premonição do atentado que o papa João Paulo II sofrera dezenove anos atrás.
 
A explicação, evidentemente, não satisfez a expectativa que durante décadas cercou o terceiro segredo, revelado numa aparição da Virgem Maria a três pastores portugueses (a irmã Lúcia, hoje com 93 anos, é a única sobrevivente), em 1917. Por isso, a Santa Sé decidiu divulgar o texto completo.
Durante décadas, livros, cultos apocalípticos e, mais recentemente, sites na internet especularam sobre a profecia. Muitos temiam que fosse o fim do mundo.
Os dois primeiros segredos, igualmente escritos em linguagem cifrada e recheados de metáforas, foram revelados nos anos 40.
O primeiro era uma visão do inferno e da salvação por intermédio da devoção ao Coração de Maria. O inferno da visão foi associado à II Guerra.
 
O segundo fazia referência à conversão da Rússia. Muitos fiéis interpretam o fim da União Soviética, em 1991, como o cumprimento dessa profecia.
O relato em linguagem simbólica do terceiro segredo é igualmente de difícil interpretação.
O cardeal Ratzinger diz que as imagens não devem ser encaradas de forma literal.
"O que permanece é a exortação à oração como caminho para a salvação das almas", comenta.
A Santa Sé enquadra os acontecimentos de Fátima no campo das "revelações privadas", que não se tornam ensinamentos da Igreja.
"Revelações como as de Fátima nos ajudam a compreender os sinais dos tempos e a encontrar na fé a resposta a esses conhecimentos", explicou Ratzinger.
 
Nesse sentido, as visões dos três pastorezinhos são diferentes da revelação divina, que se encerrou com o Novo Testamento e implica um ato de fé.
O católico não é obrigado a acreditar na mensagem de Fátima.
"O cardeal não colocou a revelação como uma questão de fé, que deve ser seguida pelos fiéis, o que diminui sua importância", interpreta Eulálio Figueira, professor de teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Ele vê os escritos de irmã Lúcia como uma amostra do tormento vivido pela Europa no início do século XX e acredita que têm de ser analisados dentro desse contexto.
Essa pode ser uma das razões que levaram a Igreja a guardar o segredo por tanto tempo, até um momento historicamente mais propício para ser revelado.
O texto do terceiro segredo
Escrevo em acto de obediência a Vós, Deus meu, que me mandais por meio de Sua Exa. Revma. o Sr. Bispo de Leiria e da Vossa e minha Santíssima Mãe.

Depois das duas partes que já expus, vimos ao lado esquerdo de Nossa Senhora, um pouco mais alto, um anjo com uma espada de fogo na mão esquerda; ao centilar, despedia chamas que parecia que iam incendiar o mundo; mas apagavam-se com o contacto do brilho que da mão direita expedia Nossa Senhora ao seu encontro.
O anjo, apontando com a mão direita para a Terra, com voz forte, disse: "Penitência, penitência, penitência!"
 
E vimos numa luz imensa que é Deus: "Algo semelhante a como se vêem as pessoas num espelho quando lhe passam por diante", um bispo vestido de branco – "tivemos o pressentimento de que era o Santo Padre".
Vários outros bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas subiram uma escabrosa montanha, no cimo da qual estava uma grande cruz de troncos toscos como se fora de sobreiro com casca; o Santo Padre, antes de chegar aí, atravessou uma grande cidade meia em ruínas, e meio trémulo, com andar vacilante, acabrunhado de dor e pena, ia orando pelas almas dos cadáveres que encontrava pelo caminho; chegado ao cimo do monte, prostrado de joelhos aos pés da grande cruz, foi morto por um grupo de soldados, que lhe dispararam vários tiros e setas, e assim mesmo foram morrendo uns atrás dos outros os bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas e várias pessoas seculares, cavalheiros e senhoras de várias classes e posições.
Sob os dois braços da cruz estavam dois anjos, cada um com um regador de cristal na mão, neles recolhiam o sangue dos mártires e com ele regavam as almas que se aproximavam de Deus.
Irmã Lúcia, Tuy (Espanha), 3 de janeiro de 1944
http://veja.abril.com.br/050700/p_064.html

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